quinta-feira, 19 de julho de 2007

O ministro à prova de leitores

Já agora, mais uma do Pedrito ...

Mas não sem antes recomendar este comentário às declarações referidas pelo Sr. Ministro em causa ...!


Ou então ... esta entrevista!

Pedro S. Guerreiro

"Augusto Santos Silva não teve coragem de fazer ontem a Viviane Reding aquilo que fez há uma semana e meia a Pinto Balsemão: ambos discordaram da intervenção do poder legislativo em matérias editoriais, mas enquanto aos alertas da comissária o ministro pediu palavra para responder; às críticas do patrão da Impresa chamou de falta de educação e mudou de assunto.
Chamar mal-educado a quem o critica é aliás um acto que define um ministro.


São três os diplomas que levaram Pinto Balsemão a acusar o Governo de “cerco” à liberdade de imprensa: lei da televisão, estatuto do jornalista e lei da concentração. Todos têm coisas más e boas. As boas não podem existir para compensar as más.


A lei da concentração limita as aquisições na comunicação social a partir de uma determinada quota de mercado, por, segundo o Governo, isso pôr em causa o pluralismo da informação. A Renascença, que tem a maior quota nas rádios, acusa o Governo de travar o crescimento dos grupos. Balsemão adita que as empresas portuguesas competem com grupos internacionais e não podem ser encolhidas na sua geografia. Ontem, a comissária pôs em causa a lógica matemática do Governo, dizendo que não há critérios para aferir a relação entre concentração e pluralismo. E, na sua opinião, uma coisa não anula a outra.


A lei da Televisão defende um inenarrável conceito de médias ponderadas, tendo as estações a obrigatoriedade de transmitir informação política proporcional à representatividade dos partidos. Aplicando esta lógica à imprensa económica, suponho que o Jornal de Negócios terá um dia que dar 15% do seu espaço noticioso ao BCP e 0,3% à Soares da Costa – os pesos destas empresas no índice bolsista PSI-20. Se isto não é interferência na linha editorial, não sei o que seja.


Já o estatuto do jornalista está aprovado no Parlamento e espera promulgação do Presidente da República, a quem centenas de jornalistas pedem veto, em abaixo-assinado (é aliás uma suprema ironia do destino, ver jornalistas pedir salvação a Cavaco). Os jornalistas devem falar pouco de si mesmos. E o ataque ao quadro normativo que os rege será sempre interpretável como corporativismo. Mas este estatuto é mau de mais para ser aceite. Tem medidas saloias e incompreensíveis, como a exigência de formação superior aos jornalistas. E é absolutamente anacrónico ao posicionar a questão dos direitos de autor nas diversas plataformas em que o trabalho do jornalista é difundido. Só quem não faz ideia de como funciona hoje uma redacção é que diz que isso é defender o jornalista. Convido o ministro Santos Silva a visitar a redacção do Jornal de Negócios, onde dezenas de jornalistas produzem todos os dias informação para um jornal, para Internet, para a TV, em vídeos, para a rádio, para telemóveis. Todos são autores, todos têm os direitos em dia.


Augusto Santos Silva não é cobarde – mesmo não gostando de ser criticado, tem dado a cara sempre que o invocam ou às suas leis. Mas tem uma visão retrógrada e conspirativa dos jornais. Suponho mesmo que não gosta dos jornalistas portugueses. O inverso também será verdadeiro: muitos jornalistas portugueses devem ter vergonha de ter este ministro.


Mais surpreendente que a ignorância e o impulso de domesticar jornalistas, o que constrange é a absoluta descrença na auto-regulação e na irrelevância dos leitores, telespectadores e ouvintes. Mas eis uma notícia: eles são infalíveis na avaliação dos media. São o nosso melhor regulador. E são à prova de ministro."

Só Agora!

Iniciação


Encontro de limites
primeiro
são para saíres
da náusea dimensão!

Procura em ti
verás que não és
aqueles
que por ti pensam!

Em breve acharás os
que somos
quem nada tem
que querer de ti?

Por aí se revelarão,
fraternos
no instante dos teu
olhar, intemporal!...

(SA, Ini 1, 3)

JRC

quarta-feira, 18 de julho de 2007

Quando a abstenção vence, vence o quê?

Quanto não vale a pena ouvir = ler as pequenas (passo a imodéstia) lições de "Pedrito", daquela "escolita" JN: Eis mais uma deste

Pedro S. Guerreiro
Lisboa é uma cidade acelerada, Capital com ambições de cosmopolitismo mas ciclópica no seu centralismo; tem mais actividade política e económica que qualquer outra paragem portuguesa; é a mais rica e tributada das regiões; aí circulam 8,1 milhões de turistas por ano, com 12 milhões a aterrar na Portela; há meio milhão de automóveis em trânsito por dia e 235 milhões de passageiros nos autocarros públicos por ano.
Pois nesta cidade grande, à volta da qual gravitam 2,1 milhões de pessoas; onde, dessas, vivem 556 mil; onde votam 532 mil eleitores; onde há doze candidatos a uma Câmara Municipal aprisionada por gravíssimos problemas financeiros; nesta cidade foi ontem eleito um líder. Por cerca de 60 mil pessoas.

É um resultado miserável. Se fosse um referendo, não era vinculativo e nada decidia, por falta de representatividade. Que representatividade tem então o sufrágio deste fim-de-semana? E como é possível que haja quem grite "vitória"?

A vitória foi da abstenção. O que significa que derrotados estamos todos. Só uma cidade sem esperança volta tão nitidamente as costas às urnas.

A elevadíssima abstenção nas eleições de ontem em Lisboa terá várias explicações. Em dia de chuviscos, a praia nem foi uma delas, mas o mês de férias sim. O pouco ambicioso conteúdo e a extensão da campanha será outra razão. E o ambíguo significado que estes resultados eleitorais em Lisboa podem ter na avaliação do Governo não é esclarecedor. Tudo isto poderá ser mais ou menos analisado. E mesmo detectados os "responsáveis", começando pelos próprios candidatos e abrindo um parêntesis para os juízes do Tribunal Constitucional, que adiaram o sufrágio duas semanas para dar tempo para a recolha de assinaturas (quando podiam ter mantido a data de 1 de Julho e prolongado o tempo para a entrega das assinaturas).

Mas nada disto tapa o essencial. Uma abstenção tão elevada não pode se não ser entendida como uma prova de falta de crença nas pessoas e nos projectos a votos. De duas uma: ou os eleitores não se mobilizaram por desmotivação e isso é um sinal amarelo ao sistema; ou, semáforo encarnado, eles mobilizaram-se motivados por uma expressão espontânea e silenciosa de reprovação não ao sistema mas aos políticos que por lá andam.

Esses mesmos políticos franzirão agora graves sobrolhos de preocupação. Mas a coisa passa-lhes rapidamente. Pedir reflexão aos partidos sobre estes resultados é inútil. A tendência vem de longe e, tirando os rescaldos eleitorais, mais ninguém se lembra que, tirando a expressiva votação em Cavaco Silva (que foi eleito com o voto de 2,7 milhões de portugueses), os nossos deputados e muitos presidentes de câmaras foram eleitos por percentagens que escondem números relativamente baixos de votantes. Rui Rio, por exemplo, venceu as eleições à segunda maior cidade do País à frente de uma coligação que teve... 63 mil votos.

António Costa ganhou as eleições mas não ganhou uma cidade. A única vantagem que tem é que as expectativas são baixas - e é mais fácil surpreender quando se espera pouco do que cumprir grandes desígnios. Mas até lá, talvez se deva pensar em expandir os meios de votação à Internet. Mas sobretudo perceber que, como acontece na economia, quando a "procura" não compra um produto é porque a "oferta" não satisfaz as necessidades. O problema é sempre da oferta. Dos partidos. Dos políticos. Dos governantes. Das oposições. E da democracia.”

segunda-feira, 9 de julho de 2007

Lições sobre este "Tempo Que Passa"

Veio-me à ideia a figura axiológica da humildade.

E, segundo creio tratar-se, até, de um conterrâneo vimarânico, não lhe encontrarei (não só por isso, mas também, entre ainda outras razões, pelo facto de lhe serem historicamente reconhecidos méritos antifascistas), grandes dificuldades em assumir a tal humildade positiva (a tal que não é, nunca, pobreza de espírito ou de estado de alma para ninguém), pois por certo terá sido esse um dos pilares da educação social que recebeu naquela sua arquétipa urbe natal.

E, porque eu também sei o que significa a fundacional vimaranidade, reconheço que, muitos mais que o Dr. Alberto Martins, tanto dentro como, e muito, fora do seu grupo partidário, deverão ler esta magnífica lição, apresentada pelo aqui meu mui citado mestre de Ciência Política JAM. E, mesmo pela sua amplitude, não me coíbo de a tanscrever aqui, no PUBLICISTA, na íntegra:

Recordações de democracia para os democratas que ainda têm a humildade de aprender lições de democracia

Assisti ao debate parlamentar sobre os sucessivos sinais de deriva pouco democrática, onde toda a oposição se uniu contra um PS que apenas declarou não receber lições de democracia de ninguém, como aqui previ com as letras todas. O discurso do PS foi proferido por Alberto Martins que nunca foi histórico de um partido a que aderiu, tarde, embora a boas horas. O do PSD por Zita Seabra, também chegada ao partido de Sá Carneiro ainda mais tarde e também a boas horas. O melhor discurso foi o da coragem de Manuel Alegre, o eterno poeta dissidente que, mais uma vez, praticou a liberdade de que continua a ser a voz, mais autêntica do que a dos ventríloquos e porta-vozes dos sistemas que perderam o sonho e a ideia de obra.


Valia a pena que o PS estudasse, com toda a humildade, algumas lições de democracia sobre o spoil system, o sistema dos troféus, correspondente ao sistema norte-americano de nomeação de novas equipas, depois da eleição de um presidente, um modelo instituído por Andrew Jackson no primeiro quartel do século XIX.

Max Weber definia-o como a atribuição de todos os postos da administração federal ao séquito do candidato presidencial vitorioso, salientando que, a partir de então, surgiu um novo esquema de partido, entendido como simples organização de caçadores de cargos, sem convicção alguma.

Com António Guterres, o spoil system passou a ser traduzido em português por jobs for the boys, antes de Durão Barroso o volver em boys for the jobs. E terá sido com base nesta experiência que Bailey considerou a política como um jogo onde os competidores actuam numa arena visando a conquista de troféus.


O que levou ao aparecimento, no modelo norte-americano, do boss, do empresário político capitalista que procura votos em benefício próprio, sem ter uma doutrina e sem professar qualquer espécie de princípios. Um político profissional típico que trata de atacar os outsiders que lhe podem ameaçar os futuros rendimentos, isto é o futuro poder.

A degenerescência em causa pode tornar-se numa rotina, a que até podemos dar o belo nome de flexissegurança, constituindo mais uma das novidades reformistas do socratismo, nascida dos nortenhos pioneirismos da DREN-Margarida Moreira e das reformas à moda do Minho do deputado Gonçalves, para não falarmos de outras voltas em Alcobaça, contra o blogue de Balbino Caldeira, com as consequentes caixas de esgoto daquela espiral de teorias policiescas da conspiração e dos seus irmãos-inimigos da perspectiva da cabala anti-situacionista. Veremos quem será depedido no final de um jogo que até pode ir de vitória em vitória até a uma derrota final que poderá ser mais encurtada no tempo.


Sou obrigado a recordar ao senhor deputado Alberto Martins parcelas de uma carta aberta que, para ele emiti, no começo do guterrismo: que "só pode haver uma democracia autêntica quando nela existir uma parcela de direita em dialéctica com uma parcela de esquerda, a tal base indispensável para o pluralismo que permite a alternância e garante o necessário controlo do poder.

Aliás, a existência de uma direita e de uma esquerda, enquanto posições relativas a um certo tempo e a um certo espaço, só são possíveis numa democracia pluralista e numa sociedade aberta, dado que, nas degenerescências da usurpação, do despotismo, da tirania, da ditadura e do totalitarismo, os usurpadores, os déspotas, os tiranos, os ditadores e os agentes do totalitarismo, venham de anteriores posições de direita ou de esquerda, assumem-se, precisamente, contra a existência das parcelas, das partes, das faccções ou do partidos, proclamando, quase sempre, que, depois deles, deixou de existir a direita e a esquerda. Todas as degenerescências antidemocráticas tendem, com efeito para a monocracia, vício que também costuma marcar os vanguardismos e os cesarimos, sempre satisfeitos com as votações dos 98% e dos 99% que, na maior parte dos casos, não são votações mas rituais litúrgicos de consagração do monolitismo.


Entre nós, o Doutor Salazar, que não veio da esquerda, que não era democrata, que proibiu os partidos e que nos governou, primeiro, em ditadura e, depois, em autoritarismo, pode ter sido genial, mas seria anacrónico considerarmos que a direita e a esquerda das nossas presentes circunstâncias estão condenadas a ser, respectivamente, salazaristas ou antisalazaristas.

O totalitarismo nazi era tão nacionalista quanto o jacobinismo esquerdista da Revolução Francesa e tão socialista quanto todos os socialismos. O totalitarismo fascista de Mussolini foi gerado por um antigo militante socialista, marcado pela memória messiânica do republicanismo maçónico de Mazzini. O totalitarismo comunista de Estaline e de Mao, esses sim, vieram mesmo da esquerda. Todos, contudo, se irmanaram na abolição da esquerda e da direita, proibindo, prendendo e assassinando os opositores. Entre todos eles, venha o diabo e escolha!


Perguntar a um direitista se ele denunciou o autoritarismo salazarista é tão insignificante quanto perguntar a um actual deputado socialista se ele denunciou, na altura certa, o estalinismo, o maoísmo ou o sovietismo vigente até 1989. O Dr. Mário Soares, que chegou a ter juvenis apoios ao estalinismo, foi um dos nossos melhores professores de democracia. Da mesma forma, só um vesgo de espírito pode negar a envergadura libertacionista de Sá Carneiro, apenas porque este foi deputado independente nas listas do partido único do regime da Constituição de 1933.

Contra o nazismo e o fascismo, ergueram-se muitos esquerdistas, mas seria injusto esquecermos que alguns dos mais eficazes opositores a essa barbárie quase demoníaca vieram da direita conservadora, à maneira de um tal Winston Churchill ou de um tal Charles de Gaulle, tal como eram da direita, e conservadores, os principais membros da resistência alemã a Adolfo Hitler, com destaque para o chamado círculo de Kreisau. Da mesma forma, houve muitos socialistas e homens de esquerda que tiveram a triste sina do colaboracionismo com o nazi-fascismo, como foi flagrante na França de Vichy, com Laval e outros mais que, depois, hão-se ser heróis da esquerda mais recente.


Aliás, em Portugal, talvez importe recordar que o líder do 28 de Maio, Gomes da Costa, era um antigo militante do partido radical e que alguns dos históricos opositores ao salazarismo eram tão direitistas quanto Paiva Couceiro e tão católicos quanto Lino Neto, para não falarmos das origens retintamente fascistas de Humberto Delgado e da marca direitistas de alguns dos mais distintos apoiantes da respectiva candidatura, onde passsaram monárquicos como Rolão Preto, Vieira de Almeida ou Luís de Almeida Braga, um pouco à imagem e semelhança daqueles miguelistas que se irmanaram com os setembristas na Maria da Fonte e na Patuleia, contra a degenerescência cabralista.

Ninguém pode esquecer a presença direitista nas revoltas da Mealhada e da Sé, e, nas próprias origens conspirativas do 25 de Abril, há uma ampla coalisão, onde não faltam oficiais monárquicos, conservadores e direitistas, reflectindo as razões que levaram os próprios Congressos Republicanos de Aveiro a terem passado a Congressos da Oposição Democrática, num movimento onde homens como Francisco Sousa Tavares, Gonçalo Ribeiro Telles ou Henrique Barrilaro Ruas, não podem ser esquecidos.


O mais importante talvez não esteja nestas viagens retroactivas pelo Ancien Régime, mas antes na circunstância da reconstrução pós-revolucionária da democracia, desencadeada a partir do 25 de Novembro de 1975, ter sido obra tanto da esquerda como da direita. Se a partir de então retomámos as senda da democracia prometida em Abril de 1974, tal só foi possível porque a força de Ramalho Eanes, Jaime Neves e Melo Antunes foi mais forte que o vanguardismo da esquerda revolucionária, dos comunistas e dos otelistas político-militares, permitindo o respeito pelo voto livre de 25 de Abril de 1975 e pelos anseios manifestados pelos manifestantes da Alameda e das muitas outras alamedas dos católicos que, a partir de Aveiro e de Braga, geraram a primeira revolução de veludo da chamada terceira vaga da democracia, conforme Samuel P. Huntington, onde Mário Soares não foi Keresnki e Ramalho Eanes se assumiu como o anti-Totski e o anti-Lenine.


Como membro da tribo político-cultural de direita, como antigo militante e dirigente de um dos partidos nucleares do arco constitucional do actual regime democrático, gostaria de declarar a Vª Exª que esta democracia é também obra da minha tribo, desses sociais-democratas não marxistas, desses democratas-cristãos, desses liberais, desses conservadores e desses direitistas, entre os quais estão alguns honrados membros do actual governo, que, em Abril de 1975, votaram contra os comunistas e o esquerdismo vanguardista do PREC, que apoiaram Ramalho Eanes e que fundaram a AD, com o PSD, o CDS, o PPM e os antigos socialistas do grupo dos reformadores, onde, ao que parece, circulavam nomes como Medeiros Ferreira, António Barreto e Francisco Sousa Tavares, não esquecendo a adesão ao sá-carneirismo da poetista Natália Correia.

Isto é, muita gente da tribo político-cultural da direita chegou bem mais depressa à democracia prática que muitos proclamados democratas da democracia vanguardista que pensam que o antifascismo de há mais de vinte e cinco anos tem de ser superior à livre manifestação da vontade popular através do efectivo sufrágio universal, como o temos praticado desde 25 de Abril de 1975.


A democracia vive-se e pratica-se. Aprende-se, fazendo-a, sujando as mãos nos compromissos com as circunstâncias do Estado de Direito. Os que apoiaram as figuras simbólicas de Sá Carneiro, Amaro da Costa e Francisco Sousa Tavares, para falar apenas nos ausentes sempre presentes do regime que temos, não precisam de pedir certificados de democrata a outros democratas com outras histórias, que talvez não tenham votado PS, PPD, CDS ou PPM em 25 de Abril de 1975, nem Eanes nas primeiras presidenciais. O democratas da democracia pluralista não precisam de pedir certificados de democrata a certos antifascistas de antanho que, depois da democracia restaurada, tentaram impor um novo totalitarismo, prendendo e matando os que não tinham o perfil dos manuais terroristas do antifascismo, para não falarmos nos grandes latrocínios da chamada Reforma Agrária e das nacionalizações decretadas nas noites posteriores ao 11 de Março, quando algumas vozes do vanguardismo chegaram a propor a restauração da pena de morte que, em 1852 e 1867, foi abolida pela direita liberal, conservadora e monárquica da regeneração. Um assassino que seja antifascista ou anticomunista não deixa de ser assassino. Um ladrão que se diga democrata, não deixa de ser um ladrão.

Um antigo apoiante do salazarismo pode ser, hoje, tão democrata quanto um antigo apoiante do estalinismo ou do maoísmo. Já tivemos antigos ministros do Estado Novo como ministros e deputados do partido de Vª Exª, bem como antigos marxistas-leninistas, incluindo estalinistas e maoístas, em governos de direita, e ainda bem!

Aqui ao lado, em Espanha, foi o rei imposto por Franco que salvou a actual democracia espanhola e ninguém, por lá, duvida do fundacionismo democrático de antigos falangistas, como Dionisio Ridruejo, de antigos direitistas da CEDA ou do homem do aparelho franquista Adolfo Suárez. Ninguém em França duvida do socialismo de Miterrand, apesar do seu passado colaboracionista com Vichy ou dos seus juvenis elogios a Salazar. Os certificados de democrata medem-se pelos serviços prestados à democracia. Confundir defensores da democracia com simples antifascistas, pode ser confundir o trigo da seara democrática com muito joio de má memória. Basta recordar que muitas das vítimas do terrorismo antifascista são precisamente antifascistas e esquerdistas. Os mais recentes alvos humanos do terrorismo da ETA eram destacados socialistas e não empedernidos franquistas. Os primeiros ataques do PREC contra a liberdade em Portugal tiveram como alvo o jornal símbolo do antifascismo lusitano, A República, órgão do socialismo e da maçonaria, quando o novo antifascismo chamava fascista a Mário Soares.

O actual regime político português, que Vª Exª serve, se deve a Mário Soares o facto deste não ter repetido os vícios dos republicanos de antes do 28 de Maio, muito também deve à circunstância de Sá Carneiro e da Aliança Democrática, depois de Eanes e do 25 de Novembro, terem dado à democracia que vamos vivendo o apoio sociológico daquela direita que, felizmente, constitui cerca de metade do país. Sem esse apoio eleitoral nunca Vª Exª poderia ter sido deputado do PS. Sem essa resistência anticomunista nunca os ex-comunistas da Plataforma de Esquerda poderiam ascender a membros do actual governo e da actual bancada parlamentar da nova maioria, aceitando-se uma reconversão que, na maioria dos casos, aconteceu depois de Gorbatchov e da queda do muro de Berlim.

Quando pessoas como o senhor deputado Alberto Martins ingressam na classe política democrática, depois de muitas memórias, como o Maio de 68, algum vanguardismo neo-iluminista e certas ilusões otelistas, a democracia fica mais forte e mesmo os adversários da outra tribo agradecem poder praticar-se aquela essência da democracia que é o diálogo com o adversário, como assinalava Ortega y Gasset.

Gostaria que a tribo político-cultural da direita e a tribo político-cultural da esquerda caminhassem cada vez mais para o centro, isto é, que se opusessem entre si, mas firmando os lugares-comuns daqueles valores essenciais das coisas que todos devemos amar e sem as quais não é possível uma comunidade política, que é sempre uma comunidade de significações partilhadas. Toda a dissolução dessas coisas que se amam, como a pátria, a liberdade e a democracia, dessas ideias pelas quais vale a pena morrer, contribui para que a coisa pública se depublicize e se corrompa. E quando falha a res publica, falha a communio e falha o consensus juris. Isto é, não há democracia sem comunidade nem Estado de Direito, onde os nomes da igualdade e da justiça coincidem".

Etiquetas: alberto martins, bailey, democracia, jobs for the boys, socratismo, spoil system, weber

(PS: Para o meu filho Manuel, neste dia de hoje, que é seu aniversário, este presente em espírito! Um abraço do Pai, estejas onde estiveres, nessa Ilha de encantos celtas.)

domingo, 8 de julho de 2007

Sobre a "bizarria" dos esquemas mediocráticos

Então como é que o Poder político vai controlar os media? Ou estaremos perante mais uma figura utópica de que, num Estado de Direito (...?) Democrático (...???...), não há controle dos media? E se há, como se concretizará essa mediocracia discreta? Através de editais públicos?
Enfim, eis mais esta peça escrita por um dos articulistas do JNegócios, a tal "escola" ...
" Balsemão ataca Governo
Os media têm que “renunciar a esquemas bizarros de controlo pelo poder político”
Pinto Balsemão fez ontem um discurso bastante critico à intervenção do Governo e do ministro Augusto Santos Silva no sector dos media. Para o presidente da Impresa, os media têm que renunciar a “esquemas bizarros e antiquados de controlo pelo poder político”.
Nuno Carregueiro
nc@mediafin.pt

No jantar da Confederação Portuguesa de Meios para a Comunicação Social, que decorreu ontem à noite, Balsemão afirmou que "o que me preocupa é o facto de o Governo, a maioria parlamentar do PS e, em particular, o ministro responsável pela área da comunicação social não compreenderem - ou não quererem compreender - o que está em jogo".

O presidente da Impresa que os novos desenvolvimentos no sector dos media obriga a "modificar o conceito de regulação, a aligeirar a intervenção dos reguladores".

E para o sector dos media encontrar uma solução vencedora para enfrentar o novo cenário, "envolve abertura, visão estratégica, capacidade de trabalhar em conjunto, bem como compreensão pelos mecanismos libertadores da sociedade civil, entre os quais a auto-regulação e a consequente renúncia a esquemas bizarros e antiquados de controlo pelo poder político".

No seu discurso Pinto Balsemão acusa ministro da tutela dos media de criar novas leis para controlar os media, dizendo mesmo que "a fúria legislativa não pára".

"O Governo propõe e o Parlamento aprova regulamentações para todos os gostos, e controlos rígidos, que vão desde a formação do capital das empresas, à programação das televisões, a quem pode e não pode ser director de um jornal, aos estatutos editoriais, aos códigos de conduta jornalística, aos livros de estilo, e aos próprios conteúdos, constantemente monitorizados por uma Entidade Reguladora à qual as sucessivas leis concedem poderes acrescidos", refere.

"Longe vão os tempos do Plano Tecnológico e da lufada de ar fresco que ele parecia querer introduzir", acrescenta.

"Pelo contrário, é flagrante e constante a insistência governamental em proibir, travar, limitar, burocratizar, impedir a adaptação e o aproveitamento, pelas empresas e pelos profissionais, da revolução em curso, da inovação constante, em matéria de informação, de entretenimento, de criatividade, de distribuição de conteúdos, de direitos de autor, de publicidade, etc..", acusa, acrescentando que "peça a peça, o cerco vai-se completando".

E diz que o Governo não está preocupado com esta estratégia do cerco. "A competitividade de um sector tão crucial como o dos media não é minimamente importante. O que interessa é burocratizar, espartilhar, controlar, cortando cerce as aspirações de convergência multimédia, de crescimento, de internacionalização que qualquer empresa de media deve ter, num mundo em acelerada mutação, em especial as privadas que não vivem do dinheiro dos contribuintes", refere.

Acerca da criação da Entidade Reguladora para a Comunicações Social (ERC), Pinto Balsemão diz que "por este caminho, ainda chegaremos ao extremo de haver quem apresente previamente os conteúdos à ERC, com medo das coimas, prisões, etc"

"Se, afinal, a estratégia do cerco não for apenas uma aflitiva falta de visão, mas um opção ideológica ou, o que é pior, uma mera tentativa organizada de controlo dos media, a questão é efectivamente muito grave. Uma democracia não funciona, não existe sem meios de comunicação social livres, ou seja, não orientados, não vigiados, não controlados", acrescentou Balsemão.

segunda-feira, 2 de julho de 2007

Eu bem digo que este Jornal é uma grande Escola

Ter "bolinhas pretas" já foi sinónimo de prestígio! ... (?)
Bem me pareceu ter ouvido um sinal de estrondo quando, um dia destes, esperando por um Professor nos corredores de uma instituição de ensino superior, onde decorria uma reunião do Conselho Científico em que ele participava, alguém disse NÃO! E toda a Instituição ouviu aquele esfarrapar de porta! A quê? Porquê? Parece que agora, publicamente, alguém veio dizer algo sobre o assunto (a não ser os posts algo inconvenientes de meu mui citado mestre JAM).
Trata-se, então, de mais esta 'bicada' do Jornal de Negócios, pela pena dessa sua autora que é a Luisa Bessa:
"Bolas pretas nas universidades
Não é só a bolsa que está ao rubro. O ambiente também está quente nas universidades. Só não há grandes manifestações de rua porque os estudantes estão sem aulas e a braços com exames. O debate que está em curso sobre o Regime Jurídico para as Instituições do Ensino Superior, que ontem foi discutido na Assembleia da República, é do maior interesse para o País, pois está em questão o modelo de governo das instituições do ensino superior.

É o princípio do fim da Lei da Autonomia, que rege as universidades há quase 20 anos, e que se foi responsável pelo desenvolvimento do ensino superior em Portugal (basta ver que em 2005 se formaram 1.177 doutorados, mais do que os 770 de toda a década de 70 e mais de metade dos que saíram nos 80) também se transformou, nos últimos anos, em parte do problema.

Os estudantes criticam a proposta do Governo porque vão perder peso nos órgãos de gestão, assim como o corpo de funcionários. Mas a grande contestação vem mesmo dos reitores.

O que quer Mariano Gago que desagrada tanto a quem dirige as universidades? Há vários aspectos, como a mudança do processo de eleição do reitor, que passa a poder ser recrutado fora da universidade, mas o que tem originado a maior oposição é a possibilidade de algumas faculdades ou centros de investigação se transformarem em fundações de direito privado, autonomizando-se das universidades a que pertencem.

Os reitores temem o desmembramento das suas universidades, que podem ficar esvaziadas das unidades mais dinâmicas, com melhor qualidade científica e maior nível de receitas próprias, que são precisamente as que podem cumprir os requisitos exigidos pelo modelo fundacional. Mas o único argumento que parece razoável na sua argumentação é o risco de se criarem instituições sem massa crítica, num momento em que a tendência vai precisamente no sentido inverso.

Na essência, a proposta aponta no sentido certo: distinguir quem é diferente e estabelecer uma cultura de mérito que tanto falta no ensino português, como aponta o economista Luís Cabral, na entrevista que pode ler nesta edição do Jornal de Negócios.

Os reitores até podem ter razão na crítica à pressa de Mariano Gago em forçar a aprovação da lei e à sua falta de disponibilidade para envolver todos os agentes num modelo que nunca poderá ser completamente consensual, sob pena de não mudar nada. Mas toda a sua argumentação fica fragilizada perante um caso como o chumbo de Saldanha Sanches nas provas de agregação para professor Catedrático na Faculdade de Direito de Lisboa.

Se Saldanha Sanches tivesse sido chumbado, assumindo os membros do júri o seu sentido de voto, nada haveria a dizer. Divergências de opinião entre académicos fazem parte da vida e não pode haver progressão académica sem avaliação. O mesmo não se aplica ao recurso ao método cobarde das bolas pretas.

Esta pequena história é a demonstração de que a universidade precisa de mudar. A instituição que é o berço do conhecimento não pode ficar refém dos piores vícios da sociedade portuguesa e ser um obstáculo à inovação, como tem acontecido. Tudo o resto acaba por ser acessório.
Retirado do J. de Negócios