Leonard Cohen
Também eu tinha os meus 16 anos quando ouvi, pela 1ª vez, L. Cohen, talvez do "Songs From a Room" (Story of Isaac ou You Know Who I Am), e marcaram a detecção da minha carência por algo que, psico-socialmente, me 'anestesiasse' e seduzisse. Passaram muitos anos, depois daqueles tripantes anos 71/ 72, passando por Paris, Caen, Isle of Man, Bruxelas e, qual Xangri La, a querida e reminiscente Amsterdam. De regresso a Lisboa, o sonho torna-se, mais uma vez, fantasia ou pesadelo, mesmo passando pelas ilusórias esperanças da 'revolução' (?) abrilista, em 74.
E porque integro este autor na "Musicologia da Libertação"? De entre as várias e múltiplas razões (estéticas: da sua música, pelo sincronismo revolucionário, explícito e implícito, dos seus poemas; personalistas: pela transposição corajosamente assumida, mas serena e transparente, das suas interpretações das contingências existênciais para as suas composições, literárias e musicais; etc.), encontrei este texto na WEB sobre o autor, que me parece sintetizar o mais importante dele:
"O mundo precisa de amor, ok? Humm, entre outras coisas, pode ser que sim, pode ser que não. Na verdade, o mundo precisa tomar vergonha na cara, assumir seus erros, deixar de choramingar pelos cantos, acreditar em um futuro melhor, e parar de reclamar enquanto este futuro não se transforma em realidade. E ouvir Leonard Cohen. Ele não é o mais feliz dos caras que já pisaram no Planeta Terra (na verdade, ele deve estar nos últimos lugares da fila, se preparando para apagar o luz quando a Terra dizer adeus para o resto do espaço), mas sabe falar de amor, se apaixonar, reclamar e sofrer com uma dignidade rara em tempos de relacionamentos politicamente corretos.
Quando decidiu ser cantor, em 1967, Leonard Cohen já vinha de uma elogiada carreira como poeta. Ao se lançar no mundo pop com folk songs que exalavam amor e ódio, Cohen abria um território novo para a literatura, e esta iniciação se deu, principalmente, com a trilogia de álbuns que chega agora, remasterizada, ao mercado, visando comemorar os 40 anos do primeiro disco do poeta canadense. "Songs of Leonard Cohen" (1967), "Songs From a Room" (1969) e "Songs of Love and Hate" (1971) trazem tudo o que você precisa ouvir de Leonard Cohen, não desmerecendo a discografia posterior, que deve ser redescoberta após essa apresentação inicial.
A história toda começa com o quase best of "Songs of Leonard Cohen", álbum que traz canções emblemáticas como "Suzanne", "Sisters of Mercy", "So Long, Marianne" e "Hey, That's No Way To Say Goodbye". Cohen canta de forma jovial nesta estréia, modo que ele iria abandonar nos álbuns posteriores em favorecimento de um modelo grave de cantar. A tristeza está presente, mas o encantamento é notável desde os primeiros acordes de "Suzanne", canção que narra a paixão real do poeta por uma mulher casada, até seu encerramento, com "One of Us Cannot Be Wrong", que traz o personagem da letra exibindo seu coração a um doutor, que prescreve o nome da amada como cura para todo seu sofrimento. Nesta reedição, duas bônus das mesmas sessões do álbum: "Store Room" e "Blessed Is The Memory", que ao contrário das dez faixas do disco, essencialmente acústicas, trazem bateria, guitarra e órgão hammond.
"Songs From a Room" inicia o processo de rendição ao desespero que se concluirá (e persistirá aqui e acolá na obra musical do bardo) com o álbum seguinte, "Songs Of Love and Hate". A produção dos dois álbuns, a cargo de Bob Johnston, torna o som mais grandioso com o acréscimo de cordas, contrabaixo, guitarra e efeitos. Cohen praticamente se esconde na capa de "Songs From a Room", que traz faixas luminosas como "Bird on the Wire", "The Butcher", "The Partisan" e "Tonight Will Be Fine". Como bônus dessa edição, demos de "Bird on the Wire" (sem as cordas) e "You Know Who I Am", que nada acrescentam a obra, mas servem como curiosidade em um belíssimo álbum que funciona como ponte de ligação entre o acanhado compositor da estréia e o dramático interprete que surge no álbum seguinte.
O fundo do poço coheniano encontra-se no poderoso "Songs Of Love and Hate". A voz cavernosa do poeta se faz notar logo na faixa de abertura, "Avalanche" (não a toa, regravada por Nick Cave), cuja letra diz: "Você que deseja conquistar a dor, deve aprender o que me faz amável / as migalhas do amor que você me oferece, são as migalhas que eu deixei atrás / sua dor não é nenhuma credencial aqui, é apenas a sombra, sombra de minha ferida". "Dress Rehearsal Rag" aparece em sua versão original, do ano anterior, inferior a oficial presente em "Songs Of Love and Hate". Já "Famous Blues Raincoat" (uma das cinco músicas preferidas de Ian McCulloch, Echo and The Bunnymen, em todos os tempos) exibe o caráter pessoal do disco: o poeta termina a letra assinando "Sinceramente, L. Cohen". Há aqui – mais do que nos dois álbuns anteriores – uma ironia que brilha tanto quanto a dor (seja na capa, que traz um Cohen barbudo e rindo abaixo do título "Canções de Amor e Ódio"; seja nas letras, como na brincadeira dos versos de "Love Calls You By Your Name").
Além de boa música, nestes três álbuns que chegam remasterizados às lojas, a poesia de Leonard Cohen (hoje com 72 anos) ganha um acompanhamento especial: letras (ou poesias, como queira, leitor) desenhos de próprio punho e fotos de época selecionadas pelo próprio poeta. E um texto ilustrativo, que analisa a produção de cada um dos três discos, assinado por Anthony DeCurtis, editor da Rolling Stone americana. "Songs of Leonard Cohen", "Songs From a Room" e "Songs of Love and Hate" servem para explicar a devoção de gente como Michael Stipe (R.E.M.), Bono (U2), Jarvis Cocker (Pulp), Nick Cave, Morrissey, Ian McCulloch, Renato Russo (que gravou uma versão de "Hey, That's No Way To Say Goodbye", registrada no CD póstumo "O Último Solo") e Jeff Buckley a este homem. O mundo precisa de amor, ok. Mas de ódio também. Não sejamos cínicos. Ou melhor: sejamos. Leonard Cohen viu o futuro, leitor: é violento. Preste muita atenção nesse homem, e olhe dos dois lados quando for atravessar a rua.
No entanto, ainda naquela procura dei de caras com outras observações, também elucidativas de outros aspectos desta personalidade singular:
"Leonard Cohen tinha 15 anos quando conheceu um imigrante espanhol que lhe ensinou através dos sons de um violão, a conquistar o coração das mulheres. Esse professor suicidou-se semanas depois ensinando a derradeira lição ao jovem Cohen. Algum tempo depois, Leonard tocava nos Buckskin Boys e escrevia poemas.
(…)
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Leonard Cohen não é um cantor de fácil assimilação às primeiras audições. As canções de Cohen são drogas pesadas, dopantes. A sua voz, monocórdica, e o instrumental, sem ornatos, não colaboram a princípio. Mas para quem se dispuser a enfrentar o estranhamento inicial, a colheita será abundante. Talvez, valha dizer que gente como Michael Stipe, Bono, Nick Cave e Frank Black sejam fãs confessos. Ian McCulloch, em entrevista ao S&Y, por exemplo, colocou uma canção de Cohen na sua listinha de cinco preferidas de todos os tempos e confessou, em outra entrevista, tremer ao se imaginar conversando com o bardo."
(Nos lista do finetune da barra lateral poderá ouvir alguns dos trechos referidos do autor)